Em julho de 1981, os moradores de Israel foram surpreendidos com uma
notícia extraordinária. Moti Éden, um repórter da Rádio Israelense,
anunciava em seu programa noturno que dois rabinos haviam encontrado a
arca da aliança e que, ele mesmo, era uma testemunha ocular do ocorrido.
O que Éden tinha de fato presenciado foi a escavação clandestina de
um grupo de judeus ortodoxos que acreditavam estar a caminho de
encontrar o valioso tesouro. Eles criam que um túnel lateral ao muro das
lamentações os levaria ao antigo lugar santíssimo do Templo, em baixo
do qual estariam escondidas as tábuas da lei e outros artefatos
originais. Hoje, o que vemos no local do antigo Templo são as
edificações islâmicas do Domo da Rocha e da mesquita de Al Aksa.
O resultado, evidentemente, foi uma reação imediata dos muçulmanos
que entraram em luta armada contra militantes judeus, causando a morte
de seis estudantes. O quadro só não ficou pior porque o rabino Meir
Getz, que liderava as escavações, cedeu a um acordo político, colocando
“panos quentes” sobre a questão. Getz morreu em 1995 e um ano depois e o
túnel foi parcialmente aberto ao público como atração turística.
A despeito da agitação, nenhuma prova concreta foi apresentada de que
a arca tivesse mesmo ali. Mas esta não foi a única vez que alguém
pretendeu tê-la encontrado.
Pretensos achados
Os etíopes dizem que a verdadeira arca estaria em seu país, numa
capela da cidade de Axum. Eles argumentam que ela foi roubada do Templo
judeu pelo príncipe Menelik, filho de Salomão e da rainha de Sabá. O
curioso é que, com exceção de uns poucos políticos, a ninguém foi
permitido ver ou fotografar a arca, o que torna bastante suspeita esta
tradição.
Vendyl Jones, provavelmente o mais excêntrico dos descobridores, foi a
inspiração para Steven Spielberg criar o personagem Indiana Jones. Com
base num obscuro texto encontrado entre os Manuscritos do Mar Morto (o
Manuscrito de Cobre), Jones diz ter decifrado o mapa de onde estariam a
arca e outros utensílios sagrados do Templo.
Em 1988, ele apresentou uma pequena vasilha de barro cujo conteúdo seria o
Shemen Afarshimon,
o óleo sagrado dos sacerdotes. Análises químicas posteriores pareceram
dar certo crédito à sua descoberta, mas o assunto ainda não está
tecnicamente encerrado. Mais tarde, em 1992, Jones mostrou aos
jornalistas um pote de cinzas que alegou pertencerem originalmente ao
ketoret, o incenso sagrado do Templo. Muitos, é claro, dizem que tudo não passa de um embuste.
Com absoluta segurança ele prometeu que revelaria em agosto deste ano
o local exato da arca. Mas até agora nada de concreto foi apresentado e
o mérito de Vendyl Jones parece ser apenas o de ter inspirado a criação
de um personagem holliwoodiano.
Dentro do arraial adventista, um profissional da área de saúde
chamado Ron Wyatt também pretendeu ter encontrado a arca. Infelizmente, a
empolgação apressada, seguida da forma fácil como a Internet divulga
inverdades, fez com que muitos irmãos, de boa fé, acreditassem na
história de Wyatt e a divulgassem, inclusive, através do púlpito.
Embora não tenhamos aqui espaço para mostrar as falhas de suas
pretensas descobertas, podemos resumidamente dizer que Wyatt afirmou ter
encontrado a arca em 1982. De acordo com sua história, Deus lhe havia
dado uma revelação especial, por ocasião de sua visita a Jerusalém,
mostrando-lhe a gruta de Jeremias, dentro da qual estaria a arca da
aliança.
Munido de uma discutível “permissão” para escavar no local, que fica
próximo à porta de Damasco, Wyatt disse ter encontrado ali a espada de
Golias, a mesa dos pães asmos, o altar de incenso e outras coisas. Sua
trama, recheada por aparições angelicais e visões de Cristo, termina com
o achado da arca e os dez mandamentos. Ron disse ainda ter tirado
várias fotos, mas quase todas queimaram. A única que restou não oferece
nada que possa ser chamado de “convincente”. Apenas uma luz forte onde
ele afirma poder visualizar o rosto de Cristo sentado num trono
celestial.
Numa teologia muito confusa, Wyatt também apontou o lugar como sendo
o Calvário e concluiu que, quando Cristo morreu, seu sangue penetrou o
solo, aspergindo a arca que estaria poucos metros abaixo. Este seria o
cumprimento de Daniel 9:24. Ora, o texto bíblico não diz que seria
ungida a
arca e sim o
santo dos santos que, se
entendido no sentido pessoal, refere-se a Cristo e, no sentido
geográfico, ao santuário celestial. Mesmo porque, o lugar santíssimo do
santuário terrestre não ficava no Calvário, mas dentro do Templo.
Ron Wyatt afirmou ainda ter recolhido amostras do sangue de Cristo,
mas, como nas declarações anteriores, tudo não passou de uma teoria
infundada. Como Vendyl Jones, ele também foi desafiado a apresentar
provas mais substanciais do que dizia. Então, prometeu que, em um ano ou
dois, voltaria ao local com uma equipe de cientistas e revelaria a arca
para o mundo. Só esperaria uma ordem de Deus dizendo que chegou a hora
de fazê-lo. Mas, Wyatt morreu em 1999 e, até hoje, nenhum de seus
colaboradores apresentou qualquer prova que legitime suas afirmações.
O que diz Ellen White?
Como muitos já sabem, a arca desapareceu por volta de 587 a.C.,
quando os babilônios atacaram Jerusalém e destruíram o Templo. A Bíblia
não descreve como isto aconteceu, mas antigas tradições judaicas revezam
entre Josias, Jeremias e Baruque a responsabilidade pela ocultação do
objeto. Ellen White, embora não mencione o nome dos envolvidos, parece
dar crédito a esta tradição. Ela diz:
“Antes do templo ser destruído, Deus fez saber a alguns de seus fiéis
servos o destino do templo, que era o orgulho de Israel …Também lhes
revelou o cativeiro de Israel. Estes homens justos, exatamente antes da
destruição do templo, removeram a sagrada Arca que continha as tábuas de
pedra, e com lamento e tristeza esconderam-na numa caverna, onde devia
ficar oculta ao povo de Israel por causa de seus pecados, não mais
sendo-lhes restituída. Esta sagrada arca ainda está oculta,
jamais foi perturbada desde que foi escondida”
Spiritual Gifts, vol. 4, pp. 114, 115 (1864);
Spirit of Profecy, vol. 1, p. 414, (1870);
História da Redenção, p. 195.
“Entre os justos que ainda restavam em Jerusalém, a quem tinha sido
tornado claro o propósito divino, alguns havia que se determinaram
colocar além do alcance das mãos cruéis, a sagrada Arca que continha as
tábuas de pedra, sobre a qual haviam traçado os preceitos do decálogo.
Isto eles fizeram. Com lamento e tristeza esconderam a arca numa caverna
onde deveria ficar oculta do povo de Israel e de Judá por causa de seus
pecados, não mais sendo-lhes restituída. Esta sagrada arca ainda está
oculta.
Jamais foi perturbada desde que foi escondida.” Profetas e Reis, p. 436 (1989). Grifos acrescentados.
Assim, descarta-se a idéia de que a arca tenha sido destruída,
arrebatada ou transferida para fora de Israel, pois com a iminente
chegada dos babilônios, os judeus não teriam tempo de fugir para longe
levando consigo um objeto sagrado que demandaria um detalhado cerimonial
de transporte.
Será a arca encontrada novamente?
A atitude de esconder objetos sagrados devido a uma ameaça iminente
não era estranha. II Crônicas 34:14-30 descreve o momento em que, em
meio à reforma do Templo, Hilquias encontrou os originais de Moisés que
sacerdotes piedosos haviam escondido durante o idolátrico reinado de
Manassés. Os Manuscritos do Mar Morto, descobertos em 1947, nas cavernas
de Qumran, também exemplificam tal comportamento. Segundo uma hipótese,
os textos teriam sido guardados ali em virtude do cerco romano sobre a
cidade de Jerusalém.
Várias tradições judaicas baseadas em Jeremias 3:16 fazem supor que a
arca reaparecerá no fim dos tempos. Embora o espaço não nos permita
expor estas tradições, torna-se digno de nota que Ellen White também
fala que as Tábuas serão trazidas novamente à vista dos habitantes da
Terra:
“Com Seu próprio dedo, Deus escreveu os Seus Mandamentos em tábuas de
pedra. Essas tábuas não foram deixadas aos cuidados dos homens, mas
foram postas na arca; e no grande dia em que cada caso estiver decidido,
essas tábuas escritas com os Dez Mandamentos serão mostradas para que o
mundo inteiro possa ver e entender. Seu testemunho contra o mundo será
inquestionável.” Carta 30, (1900).
Manuscript Releases 1401. vol. 19, p. 265.
“O precioso registro da lei foi colocado na Arca do Testamento e está
lá ainda seguramente escondida da família humana. Mas no tempo apontado
por Deus Ele revelará essas tábuas de pedra a fim de serem testemunho
para todo o mundo contra o desdém para com Seus Mandamentos e contra o
culto idolátrico de um falso sábado.”
Manuscript Releases 122, 1901.
Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol.1, p. 1109.
“Quando o templo de Deus for aberto, que triunfo não será para
aqueles que foram fiéis e verdadeiros! No templo será vista a Arca do
Testamento em que foram postas as duas tábuas de pedra nas quais foi
escrita a Lei de Deus. Essas tábuas de pedra serão tiradas de seu
esconderijo e nelas serão vistos os Dez Mandamentos gravados pelo dedo
de Deus. Essas tábuas de pedra que agora jazem dentro da arca do
testamento serão um testemunho para a verdade e os reclames da lei de
Deus.” Carta 47, 1902.
Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 7, p. 972.
Embora não possamos ser dogmáticos, estes textos parecem indicar que o
reaparecimento da Lei será um ato sobrenatural de Deus por ocasião do
Seu juízo sobre os homens. E isto ocorrerá quando cada caso estiver
decidido.
Assim, embora possamos admitir um desejo próprio de que a arca seja
encontrada, é importante ter prudência e permitir que se cumpra a
vontade de Deus. Note-se que um ponto em comum a todos os pretensos
descobridores da arca é que nenhum deles até hoje apresentou provas
concretas que justifiquem suas afirmações. Fotos que não se revelam,
soldados que impedem o acesso ou promessas que não se cumprem são
insuficientes para nos fazer acreditar neste tipo de abordagem. E é
importante lembrar que mesmo a verdade, se for sustentada com argumentos
infundados torna-se um desserviço à causa de Deus.
fonte: Professor Rodrigo P. Silva.